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Ciência da Psicologia
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Neuropsicologia no Brasil: como superar os desafios e reforçar a prática clínica

Uma análise dos obstáculos enfrentados na área, destacando a importância da formação qualificada e da integração entre pesquisa e prática clínica.

Demerval Bruzzi (CRP 01/21380)

21/08/2024 19h32

Neuropsicologia

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A neuropsicologia, área que estuda a complexa relação entre o cérebro e o comportamento, tem ganhado destaque nas últimas décadas, especialmente na avaliação e reabilitação de indivíduos com distúrbios neurológicos e psiquiátricos.

No entanto, no Brasil, essa especialidade enfrenta uma série de desafios que comprometem seu desenvolvimento e a qualidade dos serviços prestados. No artigo dessa semana, busco debater os principais desafios da neuropsicologia no país, com ênfase nas questões relacionadas à formação profissional, à falta de reconhecimento da especialidade e à necessidade de maior integração entre a pesquisa e a prática clínica.e

Formação profissional: a base fragilizada

Um dos principais obstáculos da neuropsicologia no Brasil é a formação de profissionais qualificados. Embora existam cursos de especialização e pós-graduação, a oferta ainda é limitada e muitas vezes não atende à crescente demanda por serviços neuropsicológicos. Além disso, a qualidade da formação varia significativamente entre as instituições, resultando em um mercado de trabalho composto por profissionais com níveis de habilidade e conhecimento bastante distintos.

Concordando com Leandro Malloy-Diniz, é perceptível uma “gourmetização” da neuropsicologia no Brasil, em especial, impulsionada pelo aumento significativo na procura por avaliações neuropsicológicas, muitas das quais não são realmente necessárias. Esse fenômeno pode diminuir a relevância das avaliações, uma vez que os resultados podem não atender às necessidades das investigação em questão. Ainda de acordo com as ideias de Leandro Malloy-Diniz, é fundamental lembrar que a neuropsicologia é uma ferramenta complementar, e não um método definitivo para fechar um diagnóstico.

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Um bom exemplo disso é utilização de testes projetivos dentro de uma avaliação neuropsicológica, como, por exemplo, Pfister ou mesmo PMK. E antes que os ativistas de Platão se manifestem, deixo claro que não tenho nada contra os testes projetivos, expressivos etc. Apenas estou pontuando que sua base teórica, na grande maioria das vezes, não se aplica à neuropsicologia.

É importante ressaltar que nem sempre as pessoas que procuram ou são indicadas para uma avaliação neuropsicológica apresentam alguma disfunção cognitiva ou mesmo alguma síndrome. Por isso, ainda hoje em minha prática clínica, espanto-me em ver as pessoas frustradas quando não têm um diagnóstico. Tanto pacientes como seus familiares precisam compreender que uma avaliação neuropsicológica não é o correspondente a pagar por um CID.

A neuropsicologia além da psicologia

Aliás, é crucial destacar que a neuropsicologia faz parte das neurociências e não da psicologia tradicional. Um neuropsicólogo de excelência deve estar muito próximo da neurologia, sem perder de vista os fenômenos psicológicos. Por isso, a formação contínua e a atualização sobre novas pesquisas e metodologias são essenciais para garantir que os profissionais estejam aptos para lidar com as complexidades dos distúrbios neuropsicológicos, o que infelizmente ainda não é uma constante no Brasil.

A exemplo da formação em psicologia, a falta de um currículo padronizado e de diretrizes claras para a formação de neuropsicólogos pode resultar em lacunas para o conhecimento e na prática. É sempre bom lembrar que se trata de uma área nova, recente e que até alguns anos atrás o o a esse conhecimento era por meio da medicina, nos institutos de neurologia.

touching back of head, thinking and making a choice.
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Reconhecimento da especialidade: um desafio persistente

A falta de reconhecimento da neuropsicologia como uma especialidade autônoma dentro do sistema de saúde brasileiro é outro problema significativo. Embora o papel do neuropsicólogo seja fundamental no diagnóstico e na reabilitação de diversas condições, muitos profissionais ainda enfrentam dificuldades em obter reconhecimento por parte de psiquiatras e da sociedade médica em geral.

A reabilitação neuropsicológica, por exemplo, é uma área frequentemente negligenciada pela maior parte das instituições de ensino superior. Arrisco a dizer que em Brasília, pelo menos, nenhuma instituição durante a formação do psicólogo tem essa disciplina em sua grade.

Pesquisa e prática clínica: a urgência da integração

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E ainda temos a relação entre a pesquisa e a prática clínica em instituições privadas, que é outro ponto crucial para o avanço da neuropsicologia no Brasil. Embora o país conte com importantes centros de pesquisa, a aplicação dos achados científicos na prática clínica ainda é limitada. A tradução do conhecimento científico em intervenções práticas é um desafio que precisa ser superado para garantir que os pacientes recebam o tratamento mais atualizado e eficaz.

A promoção de parcerias entre universidades, centros de pesquisa e instituições de saúde é vital para criar um ciclo virtuoso de formação, pesquisa e prática. Iniciativas que incentivem estudos clínicos e a publicação de resultados em revistas especializadas podem fortalecer a base de evidências que sustenta a prática neuropsicológica no país.

Apesar dos desafios, é inegável o progresso que a neuropsicologia brasileira alcançou nos últimos cinco anos. Ainda há muito a ser feito, mas o caminho está cada vez mais claro.

Aos interessados em se aprofundar, vale a pena conhecer os trabalhos e a certificação da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia – SBNp e também a cartilha do Conselho Federal de Psicologia a respeito do tema.

Até a próxima!

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