No dia 19 de novembro de 1969. Brasília estava parada, a partir das 21h, esperando assistir, pelas telas, em preto e branco, do Canal 6, TV Brasília, Pelé marcar o seu milésimo gol. Eram 21h30, no Maracanã, quando o camisa 10 do Santos correu para a bola, de marca ‘Drible’, e a chutou para o canto esquerdo da trave defendida pelo argentino Edgardo Norberto Andrada. E foi a milésima vez que o “Rei do Futebol” deixou um goleiro esmurrando o chão.
O jogo valia pelo chamado “Robertão” – Torneio Roberto Gomes Pedrosa – e o Santos empatava (1 x 1) com o Vasco da Gama, que abrira o placar, aos 17 minutos do primeiro tempo, por intermédio de Benetti. Jogados 33 minutos da etapa final, Pelé partiu para dentro da área fatal dos vascaínos, com a bola dominada. Os zagueiros Renê e Fernando o combateram e, ao vê-lo caído no gramado, o árbitro pernambucano Manoel Amaro de Lima marcou o pênalti – o ‘xerifão’ Renê jura não ter tocado um dedo em “Sua Majestade, o Camisa 10”.
Depois de esperar os fotógrafos escolherem o melhor ângulo para eternizarem aquele momento, enquanto os demais atletas santistas se colocavam no meio do campo, Pelé, atendendo gritos de “Pelé, Pelé”, evidentemente, de torcedores pedindo para ele cobrar o pênalti, correu para a bola e, com o pé direito, transformou aquela noite na mais importante daquela temporada futebolística dos brasileiros – até “mais + mais” do que a descida do homem na Lua, três meses antes (20.07.1969) – de nada adiantou ao lateral-direito vascaíno Fidélis fazer buracos na marca do pênalti.
Marcado o gol, Pelé apanhou a bola no fundo das redes e a beijou. Rapidamente, apareceu uma camisa do Vasco da Gama, com o número 1.000 às costas, e lhe vestiram com ela. O goleiro santista Agnaldo o colocou nos ombros – Pelé sempre tendo a bola do gol levantada – e fez a volta olímpica, com o jogo paralisado, fato inédito na história do futebol.
Pobre Andrada! “Naquele dia, eu enfrentei o mundo. No estádio, não dava para escutar a respiração de ninguém. Até a torcida do Vasco torceu contra mim”, comentou ele, tempos depois. De sua parte, Pelé confessou – também, tempinho depois – ter tremido (antes da cobrança): “O jogo parado, o estádio inteiro calado. Era eu, a bola e o Andrada. Fiquei nervoso, tive um tremendo medo de falhar, pois sabia que todos esperavam pelo gol. Poucos me viram fazendo o sinal da cruz, antes bater o pênalti”.
Descido dos ombros de Agnaldo e vendo-se diante de dezenas de microfones, Pelé pediu:” Pensem no Natal, nas criancinhas”. Antes, dissera ao repórter Geraldo Blota, da Rádio Gazeta-SP, o primeiro a ouvi-lo: “Dedico este gol às criancinhas do Brasil”.
Houve quem levantasse não ter sido aquele o milésimo gol do “Rei”, mas o marcado em 4 de fevereiro de 1970, em Santos 7 x 0 América-MEX, como atleta profissional. De sua parte, Thomaz Mazzoni, um dos maiores historiadores do futebol “brazuca”, sustentou que fora em Santos 4 x 0 Santa Cruz-PE, em Recife, dias antes do prélio contra os vascaínos. Ele computava um tento de Pelé pela seleção brasileira militar, em 1959, durante o Campeonato Sul-Americano das Forças Armadas, com seus números falando em Brasil 4 x 1 (não 4 x 3), e partida em 18.11 (e não 5 x 11).
Chegado 1995, o jornal Folha de São Paulo recontou os gols do artilheiro santista e publicou que o milésimo teria sido contra o Botafogo, de João Pessoa-PB, no dia 14 de novembro de 1969, durante a inauguração do Estádio Governador José Américo de Almeida. Por sinal, gol, também, cobrando pênalti – aos 23 minutos do segundo tempo.
Mais: pesquisa do jornalista Celso Unzelte, para a revista paulistana Placar, atribuiu só um gol de Pelé, em Brasil 2 x 1 Tchcoeslováquia, em 12 de junho de 1966. Segundo ele, um dos tentos fora marcado por Coutinho. No entanto, os pesquisadores Roberto Asssf/Antônio Carlos Napoleão afirmam, em livro cobrindo o período 1914/2004 da história dos jogos do escrete nacional, que Coutinho não atuou naquele encontro, que contam ter tido este ataque canarinho: Jairzinho, Alcindo, Pelé (Tostão) e Amarildo (Edu Américo).
Assim, há 53 temporadas, o festejado gol mil segue discutido: se foi, ou deixou de ter sido.