Menu
Mensagem Subliminar
Mensagem Subliminar

O futuro está offline

Presença é a estratégia que mais ganha força nas experiências de marca

Fernanda Lira

14/05/2025 16h00

fernanda lira 6

Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Já percebeu que a gente não aguenta mais olhar para uma tela? Que, mesmo os conteúdos mais bem produzidos, têm causado uma espécie de apatia silenciosa? Não é só você. Estamos vivendo uma era de “hiperconexão vazia” que nos trouxe velocidade, o e possibilidades — mas também uma espécie de obesidade mental. O digital deixou de ser um território de descoberta e virou um campo de exaustão.

A boa notícia é que esse excesso está provocando um movimento de retorno. À presença. Ao mundo real. A um tipo de relação que não depende de Wi-Fi. Uma tendência que começou como “detox digital” virou comportamento — e agora está se tornando estratégia de marca. E não de qualquer marca: daquelas que desejam se relacionar com as pessoas para o resto da vida. É exatamente aí que o offline ressurge como respiro, refúgio — e diferencial competitivo.

fernanda lira
Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Essa tendência não é apenas um movimento de comportamento individual, mas também uma oportunidade estratégica para marcas. Experiências presenciais viram diferencial; produtos físicos voltam a ter valor simbólico; eventos intimistas, cafés e rodas de conversa ganham mais potência que lives; jornais e livros impressos, discos de vinil, câmeras analógicas e máquinas de escrever voltam a ser desejáveis — não pela velocidade, mas pela curadoria, profundidade e pausa.

Pesquisas indicam que mais de 50% dos consumidores brasileiros já praticaram algum tipo de detox digital ou limitaram o uso das redes sociais, buscando distanciamento do mundo virtual. Nos Estados Unidos, 27% dos adultos desejam estar mais presentes durante as férias e 17% buscam ativamente viagens que os forcem a se desconectar.

fernanda lira 2
Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Globalmente, cresce o número de pessoas em busca de experiências de desconexão: viagens sem sinal de celular, cafeterias e bibliotecas que pedem para desligar o telefone, espaços culturais onde o foco é o agora.

Uma mente sobrecarregada não consome com intenção

Nosso cérebro também está sinalizando cansaço. Um termo que ganhou força recentemente é brain rot — ou “apodrecimento cerebral”. A expressão, que viralizou no TikTok, descreve um estado de exaustão mental causado pelo consumo ivo, repetitivo e superficial de conteúdo digital, especialmente em plataformas de rolagem infinita.

Segundo um estudo da Microsoft, nossa capacidade média de atenção caiu de 12 segundos (em 2000) para apenas 8 segundos — menor que a de um peixinho dourado. O cérebro humano foi feito para o foco, mas tem sido treinado para a dispersão.

fernanda lira 3
Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Essa deterioração cognitiva não é apenas individual — ela afeta diretamente o mercado. Consumidores mentalmente esgotados:
• não retêm mensagens;
• não diferenciam marcas;
• e não formam vínculos duradouros.

Ou seja, investir apenas no digital — especialmente de forma excessiva — pode ser um tiro no pé para marcas que desejam gerar memória, desejo e fidelidade.

Estamos presenciando uma busca por profundidade, conexão e tempo real — não no sentido de velocidade, mas de presença. É o slow content, o slow commerce, o slow branding.

fernanda lira 4
Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Marcas que entenderam o valor da ausência

A islandesa Siggi’s ofereceu 10 mil dólares a quem conseguisse ficar um mês longe do smartphone. A Amstel trocou três minutos de desconexão por uma cerveja. A KFC na Malásia incentivou clientes a empilharem os celulares na mesa em troca de brindes. A Lush abandonou as redes sociais para focar em experiências sensoriais nas lojas. Resorts como o Grand Velas, no México, oferecem vivências em que os hóspedes entregam seus dispositivos e participam de atividades ao ar livre. A Patagonia segue sendo exemplo: mais do que vender produtos, cria comunidades e memórias offline.

E no Brasil?
Também vemos esse movimento crescer, ainda que timidamente:
• o Sesc São Paulo promove atividades de “retiro digital”, incentivando lazer e saúde mental sem telas;
• a Havaianas aposta em lojas-conceito e ativações físicas que criam experiências sensoriais únicas e instagramáveis — sem precisar do Instagram;
• a Lush Brasil manteve a decisão de sair das redes e fortaleceu a vivência nas lojas, onde o toque, o cheiro e o olhar são insubstituíveis;
• a Patagonia Brasil realiza eventos de troca de roupas usadas, reforçando o vínculo emocional e comunitário com sua base.

Offline não é nostalgia. É inteligência de marca.

Por trás dessas escolhas há um entendimento sofisticado: marcas não vivem de likes, vivem de memória afetiva. E memória afetiva precisa de tempo, espaço, cheiro, som, toque. Precisa de presença.

Negócios que nasceram no digital agora enfrentam um desafio inédito: como criar relações de longo prazo quando tudo o que oferecem é efêmero? A resposta pode estar justamente no que parece contraintuitivo: sair das telas e ocupar o mundo real. O offline virou diferencial competitivo. Um gesto de cuidado. Um respiro na avalanche de estímulos.

fernanda lira 5
Fernanda Lira. – Foto: Arquivo pessoal

Isso não significa abandonar o online — significa dar a ele um novo papel. O digital pode (e deve) ser uma extensão coerente da experiência real. Não um palco de performance, mas um espelho da alma da marca.

Ao promover experiências autênticas e significativas no mundo real, as marcas podem fortalecer laços emocionais com seus públicos, impulsionar a lealdade e abrir novos caminhos de crescimento — mantendo a alma da marca intacta, mesmo diante da lógica frenética dos algoritmos.

O feed não precisa entreter — precisa traduzir sensações.

Se sua marca tivesse um cheiro, uma textura, um som… como ela seria? Como isso se revela nas redes sociais? Como isso aparece no espaço físico? Como se manifesta na lembrança de quem interagiu com você?

O futuro não é só digital — é sensorial, humano, real.

Estamos diante de uma oportunidade única: desacelerar e reconectar. Com o que importa. Com as pessoas. Com a cidade. Com o mundo. Com a essência do que faz uma marca ser lembrada: o vínculo.

Se marcas são feitas de relações, então vale perguntar:

Você quer construir uma que desliza o dedo… ou uma que dá vontade de voltar?

Fontes: New York Post, Rhythm Agency, Microsoft Report, Kaspersky Digital Detox Survey, Think With Google/IPSOS Brasil, CNN/USA Today, The Guardian.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado